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O governo que garantia que o seu programa era o do Memorando de Entendimento e que o seu objectivo era ir para além da troika, é o mesmo que agora diz, para contrariar a OIT – em Portugal não há oposição, são as organizações internacionais que têm de se manifestar sobre estas coisas - diz que o salário mínimo tem de ser – que não pode aumentar o salário mínimo nacional porque o Memorando da troika o impede.
Estamos entendidos!
Criado o mito da credibilidade externa, e voltando a recorrer à táctica da mentira repetida e à memória curta dos portugueses, o governo passou a criar e a alimentar outro, o mito número dois: que está a fechar o programa de resgate encomendado e assinado por outros.
À medida que se foi deixando encurralar pelos seus sucessivos falhanços o governo começou a lançar a ideia de que nada tinha a ver com a troika e com o seu programa. Que simplesmente lhe tinha calhado em sorte a missão patriótica - quiçá divina - de salvar o país, que está a levar a cabo com grande constrangimento mas não menor determinação. Começou pelo discurso da pesada herança - a que tinha começado por tentar resistir- e rapidamente passou para o papel de quem não tem nada a ver com isto.
Hoje, na Assembleia da República, ao primeiro momento de aperto, Passos Coelho voltou a sacar do seu mito número dois, pouco preocupado se um dia jurara ir para além da troika. Nada incomodado por ter anunciado que o programa de resgate era o seu programa de governo. Rigorosamente nada constrangido pelas imagens de Catroga nas televisões e no seu próprio telemóvel, na assinatura do memorando da troika. Que, com Portas, usou como escadote para subir ao pote...
E, claro, sem sombra de preocupação em dizer que está tão à beira (um ano, precisamente) de fechar um resgate como de abrir outro. Bem mais difícil, infelizmente!
Vamos percebendo, pelo que nos dizem o Gaspar e o Schauble, o governo e a UE, que está tudo a correr bem. De Gaspar, que está tudo tão bem que até já chegou um novo tempo, o de olhar para o investimento. De Schauble, que graças ao nosso pequeno génio das finanças, o processo de ajustamento português é um exemplo que deve correr mundo. Da UE, que Portugal é um caso de sucesso…
Quando se completam dois anos de intervenção da troika, será interessante pegar em dois ou três dos principais indicadores económicos e ver o que se passou, não esquecendo que nestes dois anos já se passou de tudo. Desde juras a pés juntos de Passos e Gaspar de que as metas seriam cumpridas custasse o que custasse ao nem mais dinheiro nem mais tempo. Desde o falhanço de todas as precisões de Gaspar à revisão das metas em todos os anos!
No quadro abaixo faz-se esse exercício pegando nas metas para 2013 do Memorando assinado há dois anos, para o desemprego, o défice orçamental e a dívida pública, estes, um e outra, o alfa e o ómega do programa de ajustamento. E comparando-as com os últimos números do governo, mas também com os do Relatório da OCDE, ontem apresentado.
Desemprego | Défice | Dívida | |
Pública | |||
Memorando da Troika | 13,5% | 3,0% | 114,9% |
Última revisão (Março 2013) | 17,7% | 5,5% | 123,0% |
Relatório da OCDE (ontem) | 18,2% | 6,4% | 132,0% |
Variação | 34,8% | 113,3% | 14,9% |
E percebe-se, como todos sentimos, que nada está a correr bem. E percebe-se por que é que Gaspar, ao mesmo tempo que diz que, cumprida a fase da austeridade chegou agora a altura do investimento, vai dizendo que se enganou uma vez ou outra – pedindo pelo meio que tenham pena dele por ser do Benfica - mas que o problema é do Memorando, que foi mal negociado. Exactamente o mesmo que PSD e CDS pediram, cuja negociação teve em Catroga o principal protagonista, que Passos anunciou como programa de governo e para além do qual juraram ir. Como se percebe, porque é um exercício de contorcionismo do mesmo grau de dificuldade, que diga que as diferenças entre as previsões da OCDE e do governo são umas pequenas décimas… Que se explicam por aquele organismo não ter levado em conta o recente Super Crédito Fiscal!
O tal com que Gaspar quer convencer não sei quem que vêm aí charters de investidores nos próximos seis meses. Para instalar negócios e empresas, desenhar e arrancar com projectos de investimento num contra-relógio diabólico que lhes irá garantir um bom desconto no IRC que irão pagar pelos lucros que haverão de vir das vendas que irão fazer num mercado que não existe. Claro, se todas as licenças e autorizações necessárias não demorarem dois, três, quatro, dez anos a emitir…
Não se percebe é por que é que os senhores da UE dizem que o sucesso está a passar por aqui...