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Afinal – e ficamos hoje a sabê-lo pela boca do próprio no Congresso do CDS – o famoso irrevogável de Paulo Portas foi mesmo teatro. Teatralizou mais uma vez, e desta porque, garantiu, não havia outra forma. Foi, como disse, a força do que tem que ser…
Se calhar não tinha muito mais por onde sair, mas a saída não é boa. Para ele tanto lhe faz: acha sempre que que toda a gente é de memória curta!
Portas não ultrapassa apenas todas as suas linhas vermelhas. Ultrapassa a própria linha de saída da troika…
Por mim, que acho que ele não dá ponto sem nó, esta do relógio traz água no bico. Tipo: que importam as linhas vermelhas nas pensões se até a do meu 1640 andou para a frente mais um mês?
A figura Politica de 2013: Paulo Portas
Politicamente a figura do ano foi para mim Paulo Portas. O atual vice-primeiro ministro, então ministro dos negócios estrangeiros, criou uma crise com uma demissão irrevogável, criou uma situação de indefinição à qual contribuiu Cavaco Silva, para no final surgir como o salvador que resolveu o problema. O problema é que tal ginástica para subir a "vice" custou milhões ao país.
Paulo Portas – lá estou eu a voltar a Paulo Portas – está encantado com o sucesso dos “seus” vistos gold, que já traz dos seus tempos de MNE, na era AI (antes do irrevogável).
Ao abrigo do programa – que, diz Portas, excedeu largamente os objectivos – foram concedidos perto de 500 vistos – dourados, pois claro – que se traduziram em mais de 300 milhões de euros investidos na compra de casas, que animaram o segmento de luxo do imobiliário.
Isso deixou-o entusiasmado, e bem sabemos do que é capaz um Portas entusiasmado. É até capaz de dizer que “é um sinal muito prático de que Portugal está de volta ao 'GPS' dos países em que é interessante investir"…
E eu que achava que isto é simplesmente um sinal de que o país se transformou numa república das bananas, que o quer é dinheiro, venha ele donde vier. E eu que pensava que isto é um sinal que o dinheiro tudo compra. Que venha quem vier é bem-vindo, desde que tenha dinheiro, evidentemente. E eu que era tentado a admitir que isto é sinal que este é um país onde é fácil lavar dinheiro. E eu que até já pensava que este é um país que mandou os valores às ortigas …
Estava enganado… E fico contente, tão contente como Paulo Portas, por estar enganado!
A notícia é de ontem, mas por falta de disponibilidade só hoje lhe pego. Foi trazida à estampa pelo Diário Económico e dá conta que a rábula da irreversível demissão de Portas, no princípio de Julho, e a crise política que lhe sucedeu, custou ao país 2,3 mil milhões de euros em agravamento de juros.
Não é exactamente novidade, há muito que corria por aí. Há muito que se atribui a mais esta brincadeira de Portas o momento de viragem no comportamento dos mercados, e de inversão do sentido descendente das taxas de juro. Sempre que se tem falado da saída directa da Irlanda do programa de resgate da troika comparam-se as suas taxas de juro com as portuguesas, e logo vêm à conversa as culpas de Portas.
Não é, evidentemente, aquela que foi apenas mais uma brincadeira de Paulo Portas que tem responsabilidades nisto. É mesmo injusto acusar Paulo Portas de mais esta malfeitoria, quando ele já tem tantas outras .
E não estou a defendê-lo. Até porque não seria fácil!
Quero apenas tentar pôr as coisas no seu lugar, separar o essencial do acessório. A crise política do final do primeiro semestre é da responsabilidade de Portas, isso é indiscutível. Mas surgiu na sequência de uma demissão a sério, realmente irrevogável, daquela que era a primeira e principal figura do governo: a decisiva demissão do decisivo Vítor Gaspar. Decisiva porque era exactamente quem tutelava o governo, e na verdade o representante da troika e dos credores no governo. Mas ainda mais decisivo porque, podendo simplesmente ter-se demitido, optou por explicar claramente porque o fazia: porque ele próprio falhara em toda a linha, mas também porque falhara a política em que tinha acreditado. Disse com todas as letras que a receita estava errada, e que por isso falhara!
Foi isto que foi determinante para os mercados – atenção que mercados e credores não são a mesma coisa - perceberem que o programa não funcionava e que, com ele, o país apenas se afundava cada vez mais. Foi esta declaração pública de falência do programa da troika, pela voz mais autorizada para o fazer, que fez com que as taxas de juros subissem e não mais descessem. E não as rábulas de Portas!
Só que a política se manteve e, pese embora as declarações de negação das cúpulas, especialmente do FMI, o programa da troika e do governo seguiu inalterável o seu rumo, como se Vítor Gaspar não tivesse dito nada do que disse. Era preciso fazer de conta que tudo estava a correr bem e esconder depressa as palavras do Gaspar. Por isso nada melhor que culpar Portas pelo arrepiar de caminho das taxas de juro.
Não é estranho que os comentadores do regime o tenham sacrificado para construir esta história. Estranho é que toda a comunicação social a tenha seguido!
Este governo está um mimo, exactamente no ponto.
Paulo Portas vai efabulando à volta das exportações – “uns dedicam-se às exportações e outros a manifestar-se” e outros, acrescentaria eu, a dizer e fazer disparates - sem sequer perceber que não somos produtores de petróleo.
Nuno Crato anda eufórico com os 40 mil professores já inscritos para o exame. Que ainda não perceberam que entretanto já não são professores. Que, ao inscreverem-se para o exame, deixaram de ser professores para passarem a ser candidatos a professores. E muito menos perceberam que, para o ministro Crato, deixaram de ser uma dor de cabeça – um exército de contratados excedentários – para passarem a ser uma excitante e grata surpresa. É que o ministro Nuno Crato não conseguiu esconder a surpresa pela afluência ao exame que, no seu entender, quer apenas dizer que há muita gente, jovens e menos jovens, que quer ser professor e dignificar a profissão. Gente que gosta da profissão, e isso é o primeiro passo para serem bons professores… Notável!
Notável é ainda o ministro Aguiar Branco, que garante toda a transparência no processo de reprivatização dos Estaleiros Navais de Viana do Castelo, ao mesmo tempo que diz aos trabalhadores que recebem agora as suas indemnizações mas que em Janeiro estarão de volta ao seu trabalho nos Estaleiros. Porque só eles têm qualificação para isso!
Melhor só o burro mirandês que hoje faz capa (e chacota) no International New York Times…
Depois de a Irlanda anunciar que sairia do programa da troika sem mas nem meio mas, directinha para os mercados por sua conta e risco, começou a ouvir-se da parte do governo português semelhante intenção. Ouvir tal coisa a Paulo Portas até poderia não surpreender - há muito que perdeu a capacidade de nos surpreender -, mas ser Passos Coelho a pretender que levemos a sério essa hipótese ultrapassa a nossa capacidade de entendimento do que se esteja a passar.
E não é apenas por a nossa situação económica estar bem longe da irlandesa. Nem por as causas dos problemas da Irlanda (eminentemente financeiros, do próprio sistema financeiro) e de Portugal (fundamentalmente económicos) serem completamente diferentes. Nem sequer por estarmos com resultados piores do que os levaram ao resgate. É porque ainda há pouco mais de um mês o primeiro-ministro ameaçava com o segundo resgate, e há apenas duas semanas o ministro da economia informava em versão lapso que o governo estava a preparar um programa cautelar!
Ou nada disto passa de um jogo de póquer, onde a vida dos portugueses se joga como fichas de casino ou – o que não dá em nada de muito diferente -, como não sabe para onde vai, para o primeiro-ministro qualquer caminho serve…
Já estávamos habituados. Num relatório o FMI condenava a austeridade que prescrevera para Portugal, como se não tivesse nada a ver com aquilo. Noutro criticava a Alemanha, e chegava até a acusá-la de fazer excedentes à custa da austeridade que impõe aos outros.
No entanto, como parte da troika, nunca teve dúvidas. Nunca houve a mínima rotura, nenhuma quebra de coesão dentro da troika no que á imposição da austeridade respeitava. A imagem de alguma complacência e abertura do FMI, tantas vezes apregoada por muitos observadores, nunca resultou de outra coisa que não dos tais relatórios inconsequentes e contrastantes.
Poderia não se entender - e não se entendia mesmo - esta dualidade, mas era possível especular que uma coisa seria uma convicção serôdia e, outra, uma posição repartida num caminho que estava em curso, que não poderia ser unilateralmente alterada. O que não se entende é que, agora que do pós-troika apenas sabemos o que Pires de Lima e Rui Machete deixam cair, sem que da troika se saiba o que quer que seja, aí esteja mais um relatório do FMI, precisamente a continuar a carregar na austeridade atéao fim das nossas vidas!
O problema já não é um FMI bipolar. O problema é que eles continuam por aí. Continuam a mandar, seja lá como for: chamem-lhe segundo resgate, programa cautelar ou o que quiserem. Não há 1640 nenhum, pois não Paulo Portas?
Diz-se que todos temos uma criança dentro de nós. Uns mais vezes que outros, não conseguimos deixar de soltar a criança que os anos nunca nos fizeram largar. Os psicólogos explicarão isto muito bem; eu, certamente que não. Limito-me por isso a dizer que isso é normal e até saudável, e que não é isso que faz de nós mais ou menos adultos, mais ou menos responsáveis.
O que nos distingue uns dos outros é a oportunidade em que deixamos que isso aconteça. É o momento que cada um escolhe para soltar a criança que tem lá dentro, e a frequência com que o faz, que revela a maturidade e o sentido de responsabilidade de cada um e que, em última análise, projecta a sua respeitabilidade e a sua credibilidade.
Sabemos que há adultos que nunca cresceram – e não me refiro, evidentemente, aos casos de patologia física ou psíquica - que são eternamente crianças. Não dão descanso à criança que têm lá dentro, de tal maneira que nunca recolhe, está sempre cá fora.
Não dão tréguas à traquinice, e passam todo o tempo em brincadeiras e jogos e joguetes tão mais sofisticados quanto mais desenvolvida seja a mente adulta prisioneira e refém da criança que deixam permanentemente à solta.
Quando pensamos nisto lembramo-nos imediatamente de dois nomes. Aí estão eles já na sua cabeça, amigo(a) leitor(a). Exactamente: Marcelo Rebelo de Sousa e Paulo Portas!
São pessoas divertidas, às vezes mesmo entusiasmantes, que quase conseguem que os levemos a sério. No entanto, pensando bem, ninguém lhe compraria um carro usado…
Marcelo Rebelo de Sousa, que nunca chegou ao poder – tentou a Câmara Municipal de Lisboa, mas na altura Jorge Sampaio não lho permitiu e, depois, quando Cristo veio à terra para lhe entregar a liderança do seu partido, com o pote ali tão à mão, foi curiosamente uma traquinice do menino Portas que lhe tirou o pão da boca para o colocar na de Durão Barroso – já só pensa nas presidenciais que já se começam a avistar. Ainda não deverá ser desta, mas a televisão faz presidentes…
Paulo Portas, mesmo sem nunca atingir grande expressão eleitoral – quer dizer, mesmo sem nunca ter conseguido vender o carro – já por duas vezes, mercê da nossa geografia eleitoral, chegou ao poder. Chegou ao quarto dos brinquedos de sonho e conseguiu mesmo, desta vez, depois de uma mistura de brincadeiras e joguetes com algumas birras pelo meio, apoderar-se sozinho de tudo o que era brinquedo.
E é vê-lo brincar. Brincar perdidamente… Dá gosto, só de ver. Brincou como se não houvesse amanhã com todos nós com o tal Guião da Reforma do Estado. Quando pensávamos que estaria exausto, cansado de tanta brincadeira, ei-lo de partida para a China para dar pessoalmente aos donos da EDP os esclarecimentos que eles tinham pedido por carta, explicando-lhes que aquilo do novo imposto sobre a energia (que os Catrogas e os Mexias nos farão a nós pagar) não é nada, comparado com o que ganharão com a redução do IRC. Para disfarçar a brincadeira, para que se não pensasse que só tinha ido dar explicações aos homens da Three Gorges, agendou mais umas brincadeiras para Macau. A uma delas chegou com duas horas de atraso, coisa que, pese a sua mítica paciência, os chineses tomam por ofensa e falta de consideração. Foram embora antes que Portas chegasse e, como se nada fosse, sem desculpas a pedir a ninguém, começasse a ler para uma plateia de portugueses um discurso destinado a empresários chineses. Que já lá não estavam, sem paciência para o aturar!
“Em 2011 vivemos uma espécie de 1580 financeiro. Em Junho de 2014 podemos viver uma espécie de 1640 financeiro” - Paulo Portas.
Muito bem! Finalmente alguém responsável situou o estado em que está Portugal: a caminho do ano de 1640!
No final deste ano desejaremos a todos: Bom 1640!